sexta-feira, setembro 01, 2006

O Independente (V)

António José Vilela, ex-jornalista do Independente

"Ainda Bem"

Já há muito que já ouvia falar disto, mas sempre pensei não é agora, mas foi. Hoje, sinto-me mal, sinto. E nem sequer sou um filho dilecto. Talvez mais um enteado, ou nem isso. Porventura, um namorado fugaz. Fui jornalista de O Independente, conheci-o esventrado, é certo, há cerca de dois anos e por um período de pouco mais de meia dúzia de meses. Recuperei um bocadinho daquilo que há muito tinha sentido. Adorava quanto se metiam, garantindo certezas que nem sempre o eram, com o Macário Correia, quando encostavam à parede o Duarte Lima, quando malhavam no Cavaco, cortavam o Melancia ou traziam de Macau o slogan “Soares é fax”. Mas já não era o miúdo da faculdade que o procurava no emaranhado de jornais e cheiro da mofo da papelaria Sentinela, aquele que se foi habituando ao olhar reprovador da Dona Augusta, velha comunista da secção J da Damaia, que fazia questão de tapar aquilo que eu procurava com os Avante’s amarelados. Não, não era. As cruzadas, aquelas que semana após semana lia sentado nos degraus das escadas do meu prédio, tinham-se esvaído, fruto das contradições de quem dera alma – e também ma dera a mim, jornalista - ao jornal. Se calhar, é fácil arranjar culpas lá fora, mas enfim. Parece ridículo, mas numa noite rasguei todas as colunas de opinião, fotocopiadas e encadernadas, de alguém que chegava ao CDS/PP e que algum tempo antes garantia, num daqueles serões de sábado onde o Herman há anos se tenta convencer que é, no mínimo, o Jo Soares cá do burgo, que só descansava quando O Independente vendesse mais que o Expresso, um jornal cinzentão, velho, acomodado e canibal, como de resto o é agora. E está vivo. O Independente morreu.
Ainda bem. É triste perder-se a dignidade em vida. Ninguém nos ligar. Como aqueles velhotes de suspensórios a olhar para os pombos nos jardins. É ainda mais triste quando no banco do jardim está alguém com 18 anos. Hoje, ao comprá-lo, magro, ossado, num quiosque nas redondezas da Conde Valbom apeteceu-me cuspir numa cinquentona a contas com a má fortuna de uma dúzia de raspadinhas. “Sabe, que hoje é o último Independente que leva?”, disse-lhe a empregada da papelaria. “Ainda bem”, mandou-lhe a cinquentona. E acho que lhe vi (pancada minha!) um olhar, uma expressão de regozijo. Rapidamente abandonei a tentativa de agressão líquida conformando-me. Pois, quem não gostava, quem detestava, quem queria dizer mal, estava ali a comprá-lo. A relação com o jornal sempre foi assim. Uma espécie de miúdo traquinas que foi crescendo até ser abandonado à sua sorte num qualquer Instituto de Reinserção Social.
Hoje, não quero falar do Independente mau. Também o conheci, ancorado pelas pressões e negociatas, pela incompetência ou os processos judiciais estúpidos pela cegueira do rancor ou do interesse. Hoje, quero falar da sensação que se tinha ao pegar num telefone e questionar uma empresa, uma pessoa, um membro do governo sobre isto ou aquilo. Hoje, quero dizer que entre a anarquia havia real investigação. Hoje, quero deixar aqui um mundo a preto e branco. Nós éramos os bons e eles os maus. E como eles tinham medo…"

8 Comments:

Anonymous Anónimo said...

"Já há muito que já ouvia (...)".
Jornalisticamente exemplar, não?

9:10 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

O imenso poder dos jornalistas de O Independente.... que saudades! Mas quando tu passaste por lá era apenas uma imitaçãozinha do poderio dos anos 90 do século passado.

12:42 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Também vou alinhar contigo nestas memórias do Independente. Quando editei o primeiro número do "Jornal d'África, em Abril, a Inês Serra Lopes teve a amabilidade de me dar "boleia" no seu jornal, depois de eu ter enfrentado uma vi rasteira. Dias antes, resolvi enviar sms aos meus amigos - alguns deles colados à política - com este simples texto: "não percas o Independente esta semana". Pois na sexta-feira, recebi dezenas de chamadas de alguns amigos, convencidos - e a tremer - que havia uma história "à Independente" que os iria incomodar. Pior: o susto era tanto que nem deram pelo meu jornal. Estava moribundo o Indy, estava, mas ainda mexia!

9:47 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Escribas de máscara e espada não são jornalistas, são justiceiros

4:19 da tarde  
Blogger joãoeduardoseverino said...

Que pena não falarem do tempo em que n'o independente se trabalhava com dois tipos verdadeiramente maus...para os outros. O paulo portas e o miguel esteves cardoso

4:24 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Fico sempre triste quando alguma coisa acaba....

12:08 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Ah, ganda Lélé!!!!

9:10 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

os xamadosjornalistasde caca| rebentam c o resto ! Quemcomprajornais? facamum inquerito isento1 naocomo vocesescreviam c honestidade junto de quem vendeos mesmos.evejam a vossa competencia tendenciosa...........o analfabeto. masvoces intendem...........

6:24 da tarde  

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