segunda-feira, fevereiro 06, 2006

Jornalistas e liberdade de expressão

No Sunday Times de ontem, o colunista Simon Jenkins constata acertadamente que estes cartoons "não defendem a liberdade de expressão, antes a ameaçam". Não defendem por razões óbvias. O jornalismo, como diz o autor, "não é um credo, a sua mente não está fechada ao mundo e surda às reacções". Jenkins aponta ainda outro dado que todos os jornalistas conhecem mas que as virgens suicidas da liberdade de expressão se recusam agora a aceitar: "Cada centímetro de papel impresso reflecte os pontos de vistas dos seus escritores e o julgamento dos seus editores. Todos os dias os jornais decidem qual o equilíbrio a estabelecer entre atrevimento, ofensa, gosto, discrição ou irresponsabilidade. Eles decidem quem deve ter voz e quem não deve ter. Os limites são estabelecidos por leis, decência comum e o próprio julgamento do que é aceitável para os leitores. O discurso só é livre no topo da montanha; tudo o resto é editado." Dito isto, reafirmo aquilo que o João tem dito (correndo o risco de o tresler) no canil: aquilo foi uma má decisão editorial e o jornal dinamarquês devia pedir desculpas. Assim como eu pediria se entrasse numa mesquita de sapatos; fizesse piadas com o holocausto ou não tirasse o chapéu na missa. A liberdade de expressão não justifica tudo. E o problema real, apontado ainda por Jenkins, é que se os jornalistas não agirem responsavelmente, serão os governos, em nome do (aí sim, hipócrita) conceito de "responsabilidade", que aproveitarão politicamente para coagir verdadeiramente a nossa liberdade de expressão através de leis, conselhos de fiscalização, comités de censura e o diabo a quatro.
Porque acredito que dois errados nunca fizeram um certo, também desprezo as reacções fundamentalistas árabes. Não deixo é de considerar o problema da liberdade de expressão mais grave. Afinal, nós (jornalistas e democratas) temos maiores obrigações do que as turbas de barbudos que pregam o ódio. Ou não?

3 Comments:

Blogger Luís said...

Concordo com muitas das coisas que dizes. Mas há um travo de angústia no meu assentimento. Quando os jornalistas forem todos responsáveis, e quando o critério de responsabilidade fôr a insuportável ameaça da crença religiosa, nós ficaremos todos desarmados.

12:58 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Exactamente: two wrongs don't make a right.
Aqui não está em causa aquilo que possa ser o "ocidentalismo", num terrível "the end of the world as we know it", isso já aconteceu a 11 de Setembro. Está em causa resolver, encontrar a única forma inteligente de tornear uma má decisão jornalística. Mostrar firmeza nas decisões mas sem excessos: como perante um cão raivoso (obviamente, apenas e só os fundamentalistas, não os muçulmanos em geral), não correr, mas também, se já se parou para enfrentar, não mostrar medo. Que venham as sanções económicas. Se não se chegarem a vitimizar os mais inocentes, nem todo o petróleo valerá a um suposto Islão radical isolado. A não ser que a tal bomba exista já do outro lado...

4:41 da tarde  
Blogger FTA said...

Aconselho a leitura dos post do JMF aqui e no frenchkissin. A máxima liberdade exige sempre máxima responsabilidade. E isso não pode ser confundido com conformismo, tibieza ou discussões estéticas. Em relação à última, aconselho a leitura do post do Eduardo Pitta no DaLiteratura. As caricaturas foram um produto jornalístico encomendado com um objectivo irresponsável. E se acham que eu estou a contemporizar com fundamentalistas, perguntem-me qual a minha opinião sobre a bomba atómica do Irão...

6:45 da tarde  

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