A direita, os media, os EUA e Portugal (III)
Fazer um inventário das inclinações políticas ou de uma progressiva infiltração da direita nos meios de comunicação social é uma exercício muito mais arriscado no caso português. Por duas razões.
Primeira: o centrão histórico que domina a política portuguesa torna muito menos transparente as opções editoriais e a clivagem esquerda-direita é muito menos clara no noso país do que nos EUA.
Segunda: o exercício é muito mais arriscado para mim. O corporativismo existe nos jornais e ninguém gosta que se lhe aponte o dedo como perigoso esquerdalha ou reaccionário sem salvação. Por isso, e para esclarecer o meu registo de interesses, informo pela centésima vez que pertenço à primeira categoria. A dos perigosos esquerdalhas.
E agora vamos a factos. A maior rádio portuguesa é totalmente dominada pela Igreja Católica, sua única accionista. A Renascença, todos o sabem, tenta fazer um trabalho isento do ponto de vista político mas não cede no terreno dos valores. Traduzindo: os seus jornalistas, entre os quais se podem encontrar membros de grupos religiosos como o Opus Dei ou a Comunhão e Libertação, nem sequer escondem as posições da entidade patronal no que respeita, por exemplo, ao aborto ou aos direitos dos homossexuais. Resumindo: quando se invade o terreno da Igreja, a sua rádio faz política. E à direita. O mesmo se pode dizer das outra rádios do grupo.
No panorama radiofónico, também se pode dizer que a TSF é uma rádio de esquerda. O que é curioso é que também é a rádio que mais tem sido esvaziada de meios e de jornalistas nos últimos anos. Também é menos influente politicamente do que já foi. A Antena 1, que pouco oiço, parece-me a menos politizada das estações. Ou melhor,é a que mais oscila - conforme a tutela seja de esquerda ou de direita.
Nas televisões, e continuo a cingir-me a factos, digo apenas que a SIC é a que tem melhor informação. Mas nem por isso deixa de ser propriedade do fundador do PSD, Pinto Balsemão, que é também um conhecido apoiante de Cavaco Silva. Valha-nos o facto de Balsemão ser, em primeiro lugar, um jornalista. A RTP também oscila conforme o poder que manda e a TVI era até há pouco propriedade do maior aliado político de sempre de Paulo Portas, Miguel Paes do Amaral. Vale o que vale, até porque agora são os esquerdalhas da Prisa que vão mandar, mas ainda me lembro onde é que o então líder do CDS foi explicar o seu envolvimento no caso Moderna.
Nos jornais, a luta também está a pender cada vez mais para direita. É verdade que se diz à boca pequena (e grande ) que o DN de Joaquim Oliveira faz parte da imprensa cor-de-rosa, mas basta ler o editorial Cavaco Vintage (de José Manuel Fernandes no Público) e o apoio expresso de Belmiro de Azevedo a Cavaco para se ver onde é que o meu jornal de referência se situa nos dias de hoje. O Expresso também não pode ser considerado amigo da esquerda. Maria João Avillez, nos intervalos dos jantares que organiza para a campanha de Cavaco, escreve reportagens isentas sobre Mário Soares. Para compensar, o semanário faz retratos intímos de Maria Cavaco Silva e os netos do candidato.
Na peugada do Expresso, estão todas as publicações da Cofina. Atento ao apoio de Paulo Fernandes, o dono, a Cavaco Silva, João Marcelino oscila entre editoriais entusiasmados sobre o candidato da direita e as reportagens centradas nos botões de punho do D. Sebastião. O Correio da Manhã prefere entreter-se com os dinheiros recebidos pela Fundação Mário Soares e o Record, que conste, ainda não faz política. Finalmente, a Visão e o JN parecem mais ou menos equidistantes, e o meu jornal, vou ser curto, parece-me inclinado à direita.
Finalmente, e porque me parece muito mais representativa da luta ideológica (as presidenciais vão acabar e os jornais vão voltar aos seus alinhamentos normais), a revista Atlântico apareceu no mercado. Paga integralmente com os dinheiros do grupo Millenium e Mello, a publicação dirigida por Helena Matos é o berço de uma nova direita: liberais, liberais, liberais. E conservadores. Todos os seus escritores são de direita e, em grande parte, fizeram nome no Independente ou na blogoesfera.
E sim, a blogoesfera também é representativa de uma certa tendência hegemónica da direita. Na classificação dos 25 blogues mais visitados, aparecem o Abrupto, a Blasfémia, os Marretas, a Bloguítica e a Grande Loja do Queijo Limiano. Se o último, não é propriamente classificável, os outros estão todos à direita. Para contrabalançar à esquerda, apenas se encontram o Causa Nossa e o ironicamente extinto BDE. Do Barnabé já nem se fala. Está morto e enterrado.
E o Acidental não está classificado. O grande farol do liberalismo tem audiências mais do que suficientes para ser considerado um dos blogues mais vistos no país. Em todas as áreas - uns mais do que outros - tem uma agenda conservadora. Exporta o liberalismo radical para muitos outros blogues e para outros órgãos de comunicação social (basta ver o painel de comentadores do novo programa da RTP-N Choque ideológico). Criticam permanentemente o governo de esquerda e defendem o CDS e o PSD. São defensores de George Bush e estão definitivamente ligados a Cavaco Silva, Paulo Portas, António Borges, Leonor Beleza e Manuela Ferreira Leite. É verdade que não são perigosos como os evangelistas americanos. Mas são simbólicos. Do actual lugar da esquerda nos media.
Primeira: o centrão histórico que domina a política portuguesa torna muito menos transparente as opções editoriais e a clivagem esquerda-direita é muito menos clara no noso país do que nos EUA.
Segunda: o exercício é muito mais arriscado para mim. O corporativismo existe nos jornais e ninguém gosta que se lhe aponte o dedo como perigoso esquerdalha ou reaccionário sem salvação. Por isso, e para esclarecer o meu registo de interesses, informo pela centésima vez que pertenço à primeira categoria. A dos perigosos esquerdalhas.
E agora vamos a factos. A maior rádio portuguesa é totalmente dominada pela Igreja Católica, sua única accionista. A Renascença, todos o sabem, tenta fazer um trabalho isento do ponto de vista político mas não cede no terreno dos valores. Traduzindo: os seus jornalistas, entre os quais se podem encontrar membros de grupos religiosos como o Opus Dei ou a Comunhão e Libertação, nem sequer escondem as posições da entidade patronal no que respeita, por exemplo, ao aborto ou aos direitos dos homossexuais. Resumindo: quando se invade o terreno da Igreja, a sua rádio faz política. E à direita. O mesmo se pode dizer das outra rádios do grupo.
No panorama radiofónico, também se pode dizer que a TSF é uma rádio de esquerda. O que é curioso é que também é a rádio que mais tem sido esvaziada de meios e de jornalistas nos últimos anos. Também é menos influente politicamente do que já foi. A Antena 1, que pouco oiço, parece-me a menos politizada das estações. Ou melhor,é a que mais oscila - conforme a tutela seja de esquerda ou de direita.
Nas televisões, e continuo a cingir-me a factos, digo apenas que a SIC é a que tem melhor informação. Mas nem por isso deixa de ser propriedade do fundador do PSD, Pinto Balsemão, que é também um conhecido apoiante de Cavaco Silva. Valha-nos o facto de Balsemão ser, em primeiro lugar, um jornalista. A RTP também oscila conforme o poder que manda e a TVI era até há pouco propriedade do maior aliado político de sempre de Paulo Portas, Miguel Paes do Amaral. Vale o que vale, até porque agora são os esquerdalhas da Prisa que vão mandar, mas ainda me lembro onde é que o então líder do CDS foi explicar o seu envolvimento no caso Moderna.
Nos jornais, a luta também está a pender cada vez mais para direita. É verdade que se diz à boca pequena (e grande ) que o DN de Joaquim Oliveira faz parte da imprensa cor-de-rosa, mas basta ler o editorial Cavaco Vintage (de José Manuel Fernandes no Público) e o apoio expresso de Belmiro de Azevedo a Cavaco para se ver onde é que o meu jornal de referência se situa nos dias de hoje. O Expresso também não pode ser considerado amigo da esquerda. Maria João Avillez, nos intervalos dos jantares que organiza para a campanha de Cavaco, escreve reportagens isentas sobre Mário Soares. Para compensar, o semanário faz retratos intímos de Maria Cavaco Silva e os netos do candidato.
Na peugada do Expresso, estão todas as publicações da Cofina. Atento ao apoio de Paulo Fernandes, o dono, a Cavaco Silva, João Marcelino oscila entre editoriais entusiasmados sobre o candidato da direita e as reportagens centradas nos botões de punho do D. Sebastião. O Correio da Manhã prefere entreter-se com os dinheiros recebidos pela Fundação Mário Soares e o Record, que conste, ainda não faz política. Finalmente, a Visão e o JN parecem mais ou menos equidistantes, e o meu jornal, vou ser curto, parece-me inclinado à direita.
Finalmente, e porque me parece muito mais representativa da luta ideológica (as presidenciais vão acabar e os jornais vão voltar aos seus alinhamentos normais), a revista Atlântico apareceu no mercado. Paga integralmente com os dinheiros do grupo Millenium e Mello, a publicação dirigida por Helena Matos é o berço de uma nova direita: liberais, liberais, liberais. E conservadores. Todos os seus escritores são de direita e, em grande parte, fizeram nome no Independente ou na blogoesfera.
E sim, a blogoesfera também é representativa de uma certa tendência hegemónica da direita. Na classificação dos 25 blogues mais visitados, aparecem o Abrupto, a Blasfémia, os Marretas, a Bloguítica e a Grande Loja do Queijo Limiano. Se o último, não é propriamente classificável, os outros estão todos à direita. Para contrabalançar à esquerda, apenas se encontram o Causa Nossa e o ironicamente extinto BDE. Do Barnabé já nem se fala. Está morto e enterrado.
E o Acidental não está classificado. O grande farol do liberalismo tem audiências mais do que suficientes para ser considerado um dos blogues mais vistos no país. Em todas as áreas - uns mais do que outros - tem uma agenda conservadora. Exporta o liberalismo radical para muitos outros blogues e para outros órgãos de comunicação social (basta ver o painel de comentadores do novo programa da RTP-N Choque ideológico). Criticam permanentemente o governo de esquerda e defendem o CDS e o PSD. São defensores de George Bush e estão definitivamente ligados a Cavaco Silva, Paulo Portas, António Borges, Leonor Beleza e Manuela Ferreira Leite. É verdade que não são perigosos como os evangelistas americanos. Mas são simbólicos. Do actual lugar da esquerda nos media.
20 Comments:
pode-se acrescentar este para tentar engrossar a lista de blogs posicionados mais à esquerda:
http://jumento.blogdrive.com/
Já agora não se importa de referir o meu http://pracadarepublica.weblog.com.pt
como estando cada vez mais a Sul?
Francisco,
Escrevi que o JM teria umas palavritas a dizer sobre este assunto. E nao e' que acertei: "Chocante. Leio no Mau Tempo no Canil que nos Estados Unidos a direita consegue estar presente na televisão, na rádio e até nos blogs. E o pior é que há quem, de livre vontade, lhes dê atenção"
O JM e um fenomeno!
Um abraco,
Joao Galamba
Francisco, nós não estamos inscritos no blogómetro porque o Paulo Querido não deixa.
Abraço,
PPM
Caro PPM, é uma rotunda mentira o que aqui escreveu.
Caro FTA, parabéns pela análise.
ora aqui está uma sequência de postas, ao melhor estilo da Maria Filomena Mónica, que vai dar muito pano para mangas...
Até que enfim, uma análise justa e lucida do panorama editorial.
Mas vá lá explicar isso ao P.Pereira.
O que ele quer (velho truque estalinista)é fazer crer que é tudo de esquerda(os jornalistas) para "centralizar" a comunicação no cinzentismo que agora vivemos.Nunca anteriormente houve tanta opinião (nos media,nas tv's, nos blos, nas radios,etc...)como hoje, e nunca antes houve tão pouca originalidade e rasgo.
Existe um centralismo de pensamento unico que dá nauseas.E os media dão o "quadrado",as "baias" do pensamento publico.Superficialismos, fait divers, "necrologia", tudo serve para não pensar, basta "identificar" e deixar que se projete o lixo emanado de cabeças bem pensantes, cuja vida é dizer mal da vida dos outros.
É assim que eles nos querem, "mansos", acriticos, cinzentos e que trabalhemos muito.Faz lembrar "Magnificent Seven" dos Clash. Give me all you got.
Suckers. Mother...
PS - O Canhoto é um grande blog de esquerda onde se podem encontrar excelentes análises que desmontam os
argumentos dos neocons cá do burgo.
930 - O Acidental (stats) - 328 - 0 - 1930 - 1
930 é a posição em que O Acidental está no "famigerado" blogómetro. É comparar com o sitemeter quanto aos números. Isto é que é uma mentira rotunda, Paulo Querido.
PPM
Gostaria de lembrar mais 3 blogues (à esquerda) de excelentes conteúdos e análises: ÁGUALISA(4, PUXAPALAVRA e TUGIR.
Já se percebeu que esta malta toda não trabalha.
Adelino Cunha (cansado, depois de fechar mais uma edição em papel escrito e com notícias para pessoais intelectualmente normais e socialmente inseridas)
Caro Martim
Para perigoso esquerdalho (essa do esquerdelhas parece-me uma tentativa bem-comportada do termo) nota-se forte tendência para a distracção.
Medir as audiências de um blog pelo sitemeter (o assunto está mais que debatido) é pura falácia.
É pena que quem assim se faz medir não deixe em aberto o “by referrals” para que se constate que a maior parte dos acessos são enganos de consulta nos Googles deste mundo.
Observe com atenção e ficará surpreendido com o facto de alguns Blogs (com médias de consulta diária na ordem dos 300 acessos) terem “clientelas” quase exclusivas de endereços fixos ou de outros Blogs. Talvez essa medida seja mais fiável para a análise que pretende fazer.
Irá descobrir que, para além da pornografia e de muitos blogs de consulta google (se quiser poderei um dia explicar-lhe o sucesso), existem muitos outros de esquerda que lhe escapam.
Tente o exercício e terá uma surpresa.
Ja que se fala de esquerda e direita deixo aqui um link do meu ultimo post http://ometablog.blogspot.com/2005/11/delimitacao-da-esfera-politica-e.html
Puxando a brasa à minha sardinha, é bom não esquecer o DESCRÉDITO...e já agora o TUGIR EM PORTUGUÊS !
Caro int:
De facto, o Martim não é um perigoso esquerdalha. Esse é mais o meu departamento e é por isso que o artigo está assinado com o meu nome - Francisco Trigo de Abreu.
De resto, gostava de agradecer a todos os comentadores, especialmente ao João Galamba, a participação nesta discussão.
Um abraço.
Nao penso que o Bloguitica possa ser considerado de direita. Pelo contrario, todas as ideias que o Paulo Gorjao defende sao claramente de centro-esquerda.
As minhas desculpas ao Martin.
Como se percebeu o meu comentário dirigia-se a Francisco Trigo de Abreu a quem igualmente peço desculpa pela falta de atenção.
Luís Novaes Tito (LNT)
(outro esquerdalho que engrossa no Tugir a lista dos blogs de esquerda)
E tivemos a típica analise esquerdista dos media.
Não são as colunas de opinião e os editoriais que definem os jornais, nem eles são especialmente de direita. A Visão e JN equidestantes?!
O poder da esquerda nos media está na escolha dos assuntos e dos factos politicos e esse poder é quase total.
Artur Portela Filho protestou pela interferência do ministro na AACS foi uma noticia de rodapé.
Sampaio dá umas bengaladas duras a Sócrates na Justiça de nada se fala.
só alguns exemplos
lucklucky
Caro Luis Novaes Tito:
O seu comentário era bom, educado e pertinente. A troca de nomes foi só um pormenor.
Volte sempre,
Francisco
Caro JMT:
Tem toda a razão em relação à profundidade das matérias.
Mas também é por isso que as duas primeras metades foram publicadas no NY Review of Books. A III é apenas uma produção caseira, e feita à pressa, para o mau tempo. E que eu gostaria de ver aprofundada por outros.
Não é caro JMT é caro JPT. Pelo erro, ficam as desculpas.
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