quinta-feira, março 30, 2006

Viniciu de Moral*


Aproveito as férias para ouvir com atenção o CD (2003) comemorativo daquele que seria o 90º aniversário de Vinicius de Moraes se este morasse ainda no reino dos vivos. A poesia, música e depoiementos explicam um pouco da vida daquele que muitos (a começar pelo próprio) consideravam o branco mais negro do Brasil. Numa nota introdutória ao disco lembra-se logo uma letra de uma música de Carlinhos de Oliveira: "Se eu tivesse/ Se eu tivesse/ Muitos vícios/ O meu nome poderia ser Vinicius/ Se esse vícios fossem muito imorais/ Eu seria o Vinicius de Moraes". Vinicius também entra neste jogo de espelhos falsos: "Se alguém me perguntasse quem eu gostaria de ser, se não fosse eu próprio, responderia sem hesitar...não, eu confesso que hesitaria entre Pixinguinha e Ciro Monteiro".
E o resto é vida. Como daquela vez que foi apanhado pela mulher a "paquerar" uma amiga: "Mas ela é tão feinha"; ou da outra história, aquela em que uma das suas companheiras de serão se sentiu indisposta com o muito uísque que se bebia na mesa. Saiu para a casa de banho e quando voltou, pouco refeita ainda, ouviu Vinicius perguntar: "Vomitou direitinho, filha?".
Foi letrista das mulheres, da música, da alegria e da tristeza: "Mas pra fazer um samba com beleza/É preciso um bocado de tristeza/Preciso um bocado de tristeza/ Senão não se faz um samba, não/ Senão é como amar uma mulher só linda/ E daí? Uma mulher tem de ter qualquer coisa além da beleza/ Qualquer coisa de triste/Qualquer coisa que chora/ Qualquer coisa que sente saudade/Um molejo de amor machucado/Uma beleza que vem da tristeza de se saber mulher/Feita apenas para amar/Para sofrer pelo seu amor/ E pra ser só perdão".
Foi ainda homem sereno. A seu respeito, explica Calazans Netto: "(...)Então a nossa conversa sobre como a gente podia ver um dia em Itapoã. Era o nascer do sol ao morrer do sol, às vezes sem fazer absolutamente nada: que chega um tempo que você descobre que o bom é não fazer nada. É ver o dia passar". Poeta intemporal ("Eu morro ontem/ Nasço amanhã/ Onde há espaço/ Meu tempo é quando"), deixou o Brasil orfão. Conta-se no CD que, a propósito de um encontro de Vinicius com uns amigos americanos, o jornalista Luís Carlos Sarmento mostrou-se indignado, antes do tempo, com a possibilidade de perder o poeta: "Vocês podem levar as nossas riquezas, nossos minérios, podem levar tudo. Mas o nosso poeta, não!" Perdeu-se Vinicius mas foi para o amor: "Resta esse diálogo quotidiano com a morte/Esse fascínio pelo momento a vir/ Quando emocionada ela virá me abrir a porta, como uma velha amante/sem saber que é a minha nova namorada".

*Sérgio Porto jura , num atestado da ubiquidade de Vinicius, que o viu ao mesmo tempo sentado num Bar de Ipanema e num bar de Petrópolis: "Concluiu o saudoso Sérgio que Vinicius era plural, mais de um Viniciu de Moral".

2 Comments:

Blogger Dia said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

4:23 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

E já que estás numa de mpb, que tal espreitares o génio do Cyro Monteiro, hmmm?

Toma lá um cheiro

Se acaso você chegasse
No meu chateau e encontrasse
Aquela mulher que você gostou
Será que tinha coragem
De trocar nossa amizade
Por ela que já lhe abandonou?

Eu falo porque essa dona
Já mora no meu barraco
À beira de um regato
E de um bosque em flor
De dia me lava a roupa
De noite me beija a boca
E assim nós vamos vivendo de amor

Dia

4:24 da tarde  

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