quinta-feira, janeiro 26, 2006

A inominável

A Ana já falou dela. Da minha escritora favorita da blogoesfera. Da inominável. Da que não se linka. Da que não se fala. Da secreta. Tenho a certeza que este roubo compensa. Os leitores do canil.

Ressaca e lição de gramática
[post modificado; a primeira versão não me satisfez plenamente e foi nas filas de trânsito que separam a Estados Unidos da Viriato que surgiram as alterações, ao ritmo da chuva enxotada com força pelos limpa pára-brisas]

Espera-se que o dia nasça claro, ou então coberto de nevoeiro.

[pedi, de madrugada, pedi à santa da minha rua, um dia que me desse tudo de mão beijada, ou então, um que me escondesse as feições por entre uma espessa camada de névoa - um dia cheio de humidade, um que me matasse os ossos e me encaracolasse o cabelo]

Espera-se outra oportunidade de utilizar o pretérito mais-que-perfeito do Indicativo - um amor mais que perfeito não merecia ser conjugado em outro tempo verbal. Mas só me entram pela sala antiga, de gaioleira pombalina, verbos no pretérito imperfeito: era, sonhava, cantava, escrevia. Do pretérito perfeito, há um que badala, ensurdecendo: chorei.
Mas são todos pretéritos. Já foram, já eram. Não são mais.
Barraram-lhes o caminho abruptamente, de surpresa, montaram-lhes uma cilada quando iam a caminho de um presente feliz, e tolos, os verbos, nunca pensaram sequer no futuro, teimaram comigo que o que importava mesmo era um dia após o outro, com muita fome e com muita sede, como se o dia não acordasse na manhã seguinte. Nem com sol, nem com chuva, nem com nevoeiro.
Espera-se com todo o ser pelo castigo divino, deseja-se que o Deus do Antigo Testamento ande por cá hoje, espera-se que inflinja tanta ou mais dor a quem me fez (mais uma vez no passado) chorar com soluços (chorar com soluços é caso sério; dói nas entranhas, corta a respiração, limita os movimentos e anestesia o cérebro).
Espera-se. Espera-se pacientemente pelos dias melhores, com gargalhadas sonoras (espera-se uma comédia e uma sala de cinema escura e os vizinhos das cadeiras a mudar de lugar a meio da película, porque me rio demasiado alto e nunca páro de bater com a perna direita no chão, como se estivesse inquieta à espera de fazer uma prova oral - nunca fiz nenhuma e seria o descalabro; não sei falar, apenas escrever). Espera-se posts sobre a minha família cada vez mais minimalista e disfuncional; histórias que façam rir, e às vezes chorar, os meus leitores (384 visitas; para lá dos meus sonhos mais loucos).
Espera-se que, talvez mais logo, quando a noite cair, já se consiga descansar o corpo no sofá laranja - por enquanto, é impensável lá deixar emprestado seja o que for; foi ali que eu dei o meu melhor; foi ali que namorei meses a fio, foi ali que escrevi um amor.
Espera-se que, do outro lado, haja a decência de rasgar em mil bocadinhos uma carta escrita com letra miudinha, uma rídicula carta de amor, e já que a lua trouxe uma maré de súbita de determinação e o alarme da consciência disparou num dia que eu sonhei ser perfeito e para lá de feliz, espera-se que um x-acto risque sem piedade um CD que foi entregue por estafeta.
Espera-se tudo: que o cabelo cresça até ao rabo cada vez mais enfeitado de branco, que as unhas deixem de se partir para arranharem as costas de um amante e que as rugas se fixem no rosto com arte. Espera-se um natal feliz e uma árvore enfeitada em tons de cobre. Espera-se um sofá de outra cor, ou pelo menos espera-se uma manta para tapar o laranja que não me deu sorte. Espera-se uma cama nova, de madeira, rasteirinha ao chão, porque esta só me deu desgostos. Espera-se amigos que ainda não conheci. Espera-se pelos que conheço há décadas e que estão sempre lá para contrariar a minha bipolaridade. Espera-se um amor incondicional, um que bata à porta deste blog, que entre pela janela sem ser chamado, como o outro, o que era (pretérito imperfeito) mais que perfeito.

Espera-se tudo de bom, tudo de mal. O que não se espera é que passe amanhã, ou para a semana, como das outras vezes.

4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Vocês irritam, sabiam? por vocês entendam-se a asl do glória fácil e fta deste antro. Esta coisa de abrir o apetite para o misterioso blog da Diana Ralha (presumo eu, pelas "conversas") e depois népias é digno de seguidores convictos do caro Alphonse

3:06 da tarde  
Blogger FTA said...

Só te razão numa pequena parte do seu comentário: eu sou muito irritante.

3:22 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

hum... quer-me convencer q nem uma pitadinha donatienica o tempera?

3:39 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Continuo a dizer isto: quem dera que as minhas orelhas ficassem encarnadas sempre que alguém fala do meu misterioso blogue.

3:42 da tarde  

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