quinta-feira, dezembro 16, 2004

Jornalismo

Ser jornalista é uma missão. Que tem como último dever o de informar as pessoas. Aquelas que não podem estar junto dos acontecimentos para formar a sua opinião. Aquelas que não têm acesso directo aos protagonistas ou aos factos e que, através dos jornalistas, sabem o que dizem, pensam, fazem, e assim formam o seu juízo.
O dever último dos jornalistas não é para com os órgãos para que trabalham. Não é para com as fontes que alimentam o seu noticiário. É, sempre, para com aqueles que vão ler o que escreve, que vão ouvir o que diz ou que vão ver o que transmite.
Por isso, de cada vez que possa haver um qualquer conflito de interesses, maior ou menor, algo semelhante a um ruído entre o mensageiro e o receptor, que possa perturbar a mensagem, é dever do jornalista: ou abstrair-se de comunicar; ou tornar clara, o mais clara possível, essa perturbação.
A bem, uma vez mais, daqueles que são informados.
Não se pode defender um jornalista que entrevista um ex-ministro quando quatro meses antes era assessor do Governo desse ministro, porque é nosso amigo. Nem se pode atacar as pessoas por não serem nossas amigas.
As leis são gerais e abstratas. Também os deveres éticos e deontológicos são para cumprir escrupulosamente seja quem for o visado. Sempre e em todas as circunstâncias.
Não podemos agora defender o DD e daqui a uns meses vir a zurzir no Rui Calafate se estiver a entrevistar o Santana Lopes ou o António Mexia para um qualquer órgão de comunicação social. Não se pode. Não se pode agora defender o DD e há um ano considerar inaceitável que o Fernando Lima saltasse do Governo para a direcção do DN. Não se pode. (haverá sempre e para cada caso um amigo que faça juras de probidade. Isso não chega)
É jornalista quem quer e quem pode. Sai do jornalismo quem quer e quem pode. Mas não pode voltar ao jornalismo quem quer. Apenas quem pode.
Serve para este caso e serve, na minha opinião, para todos os outros. Não considero legítimo que o presidente da direcção do Sindicato dos Jornalistas (reeleito) seja sistematicamente candidato nas listas do PCP, e apareça como arauto dos princípios éticos e deontológicos. Não considero legítimo que as redacções estejam apinhadas de ex-assessores e de futuros assessores.
Não considero legítimo que os ex-assessores voltem a tratar dos mesmos assuntos, agora do outro lado da trincheira. Ontem, hoje e sempre. A bem dos leitores.
Eu, por mim, estou hoje do mesmo lado da barricada em que me encontrava amanhã. E desta trincheira só saio quando morrer.

PS: O David era meu amigo antes de eu e ele sermos jornalistas. Era meu amigo quando ambos eramos jornalistas. Continuámos amigos quando eu era jornalista e ele assessor. É hoje meu amigo, ambos jornalistas. E será, para mim, sempre meu amigo. É um tipo sério, probo, honesto e limpo. Um abraço.

5 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Se tivesse um blog...
se tivesse pachorra...
se achasse que valia para alguma coisa coisa...

...escrevia o que tu escreveste sobre o DD.
N.S.L.

5:54 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Desiludo-me cada vez que vejo pessoas que preferem escrever as suas opiniões a dizer aos amigos cara a cara o que pensam das suas opções de vida. MMO

5:59 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Meu caro,
Concordo contigo, independentemente de quem sejam os visados (como o DD, por quem também tenho amizade). A minha teoria é a da dupla traição. Ser assessor não é vergonha para ninguém. Mas quando se regressa de imediato a uma redacção e logo para funções tão directamente relacionadas com o que se estava a fazer, de duas uma: se o jornalista cumprir a sua função e contar o que sabe, o que viu, e tudo o que se passou enquanto esteve do outro lado, comete traição contra o político (ou as pessoas) com quem esteve a trabalhar, e isso ninguém deve fazer; se o jornalista não contar o que sabe e o que viu, e se não investigar as histórias duvidosas trazidas dessa experiência, comete traição contra a missão que é o jornalismo e contra a ética da profissão, o que o impede de a exercer livremente. Acho que é um dilema. Cada um que passa por esta porta giratória entre a política e a redacção sabe o que prefere trair.
V.M.

10:59 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

O David é "um tipo sério, probo, honesto e limpo", escreve o Martim. Quanto a mim, não seria preciso dizer muito mais.
As pessoas falam, criticam, arranham — com razões válidas, é verdade — mas, a maior parte das vezes, esquecem o essencial: a seriedade. Ou se é sério ou não se é sério. Como jornalista, como assessor, como médico, como professor, como canalizador, como vigilante, como tudo na vida. As pessoas falam, criticam, arranham os assessores que voltam ao jornalismo (essencialmente nas circunstâncias em que o David voltou), mas é raro, mesmo muito raro, ouvir as pessoas falarem criticarem, arranharem aqueles jornalistas que nunca na vida foram assessores, mas é como se fossem. Precisamente aí, onde está a falta de seriedade, de honestidade intelectual e de respeito pela profissão.
Devia haver uma carreira na assessoria, tal como há uma carreira no jornalismo. Porque é que um assessor de um governo de direita não há-de, no momento seguinte, ser assessor de um governo de esquerda? Haja seriedade. Desfaçam-se os preconceitos.
Acho absolutamente disparatadas as comparações Rui Calafate/Santana Lopes e Alfredo Maia/PCP.
Critiquemos quando devemos criticar, mas critiquemos factos concretos. A entrevista ao Morais Sarmento foi tendenciosa? Na minha opinião, não foi.
Avaliemos primeiro, critiquemos depois.
O David é meu editor e critico-o muitas vezes, por várias razões, dentro deste jornal. Mas nunca me aconteceu criticá-lo por falta de seriedade profissional, por falta de honestidade intelectual ou por algum laivo de "partidarite" que pudesse afectar o meu trabalho.
B.B.

12:55 da tarde  
Blogger inês said...

gosto de te ler, pá! gosto mesmo.
IR

7:29 da tarde  

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