Apologia da Indisciplina (arquivo)
Na biografia de Garincha, Estrela Solitária, o escritor Ruy Castro conta-nos que durante o estágio da selecção brasileira na Suécia em 1958 a selecção canarinha instalou-se num hotel que tinha uma colónia de nudistas na redondezas. No final de um treino, o seleccionador pediu aos jogadores que acabassem com uma corrida rápida rumo ao hotel. Todos reclamaram. No segundo e no terceiro treino já ninguém reclamou. O treinador veio a descobrir então que os indisciplinados jogadores erravam prepositadamente o caminho de retorno ao hotel para verem as suecas nuas.
Passemos agora da floresta à arvore: Mané Garrincha, a estrela dessa selecção de 58, pode facilmente considerar-se o mais indisciplinado jogador de sempre. No mesmo estágio, e apesar da proibição dos jogadores terem relações sexuais, Garrincha e um colega da equipa esgueiraram-se de um hotel para um encontro com duas suecas. Perante a beleza arrebatadora das duas nórdicas, Garrincha disparou: "Você escolhe. Eu fico com a que você não quiser. E se não quiser nenhuma, eu fico com as duas".
A indisciplina de Mané também era no campo. Mais do que uma vez continuou a fintar jogadores depois da bola já estar fora das quatro linhas. O biógrafo de Garrincha também imortalizou o episódio em que um treinador do Botafogo tentou disciplinar o jogador em campo. Pôs uma cadeira no meio do terreno e ordenou a Mané que a ladeasse coma bola e centrasse de imediato, evitando os rodriguinhos habituais. Queria discipliná-lo. Garrincha fez a bola passar pelo meio das pernas da cadeira e centrou. Escusado seria dizer que o Brasil ganhou o Mundial de 58, Garrincha foi o melhor jogador do campeonato e nasceu um herdeiro sueco.
Se este texto se tratasse de um verdadeiro tratado sobre a indisciplina verdadeiro também podia lembrar George Best (o nome diz tudo) ou evocar que Zlatan Ibraimovich, o jogador da Juventus que já fintou uma equipa inteira, tem cadastro na Holanda. Romário, que não treina quando não o deixam sair à noite ou jogar futevólei, foi o melhor marcador do Brasileirão aos 39 anos e Cristiano Ronaldo juntou-se recentemente a galeria de génios indisciplinados ao desencantar um gesto bastante gráfico no jogo entre o Benfica e o Manchester. Já para não falar de Maradona. Duvido que fintar a equipa toda de Inglaterra estivesse no esquema táctico do treinador argentino. E também é certo que jogadores disciplinados não marcam golos com a mão. Mesmo evocando o nome do senhor.
Por outro lado, sempre me pareceu da mais elementar lógica que nem sequer se deve tentar disciplinar os artistas. Tomemos como exemplo a pintura: Caravaggio apunhalava inimigos nos intervalos das estocadas do seu pincel. Jackson Pollock atirava, indisciplinadamente, tinta para telas espalhadas no chão tornando-as obras primas. O atelier do inglês Francis Bacon era uma notória e indisciplinada pocilga. Traduzindo: a disciplina é boa mas é para as actividades racionais. Por exemplo, Immanuel Kant era metódico, regrado e bom filósofo. Não consta que fosse bom de bola...
Dito isto, informo que é com grande escândalo que vi Liedson ser castigado por usar calças de fato de treino. É que a história é sempre a mesma: enquanto os parolos cá do sítio elogiam a veia disciplinadora de Paulo Bento, eu limito-me a constatar que o meu clube não vai ganhar nada enquanto não recuperar a picanha, a cuíca, os bacanais, o Ferrari e os quilos a mais do Rochemback. Já para não falar no épico "vai tomar no...". Bem, vocês sabem onde.
Passemos agora da floresta à arvore: Mané Garrincha, a estrela dessa selecção de 58, pode facilmente considerar-se o mais indisciplinado jogador de sempre. No mesmo estágio, e apesar da proibição dos jogadores terem relações sexuais, Garrincha e um colega da equipa esgueiraram-se de um hotel para um encontro com duas suecas. Perante a beleza arrebatadora das duas nórdicas, Garrincha disparou: "Você escolhe. Eu fico com a que você não quiser. E se não quiser nenhuma, eu fico com as duas".
A indisciplina de Mané também era no campo. Mais do que uma vez continuou a fintar jogadores depois da bola já estar fora das quatro linhas. O biógrafo de Garrincha também imortalizou o episódio em que um treinador do Botafogo tentou disciplinar o jogador em campo. Pôs uma cadeira no meio do terreno e ordenou a Mané que a ladeasse coma bola e centrasse de imediato, evitando os rodriguinhos habituais. Queria discipliná-lo. Garrincha fez a bola passar pelo meio das pernas da cadeira e centrou. Escusado seria dizer que o Brasil ganhou o Mundial de 58, Garrincha foi o melhor jogador do campeonato e nasceu um herdeiro sueco.
Se este texto se tratasse de um verdadeiro tratado sobre a indisciplina verdadeiro também podia lembrar George Best (o nome diz tudo) ou evocar que Zlatan Ibraimovich, o jogador da Juventus que já fintou uma equipa inteira, tem cadastro na Holanda. Romário, que não treina quando não o deixam sair à noite ou jogar futevólei, foi o melhor marcador do Brasileirão aos 39 anos e Cristiano Ronaldo juntou-se recentemente a galeria de génios indisciplinados ao desencantar um gesto bastante gráfico no jogo entre o Benfica e o Manchester. Já para não falar de Maradona. Duvido que fintar a equipa toda de Inglaterra estivesse no esquema táctico do treinador argentino. E também é certo que jogadores disciplinados não marcam golos com a mão. Mesmo evocando o nome do senhor.
Por outro lado, sempre me pareceu da mais elementar lógica que nem sequer se deve tentar disciplinar os artistas. Tomemos como exemplo a pintura: Caravaggio apunhalava inimigos nos intervalos das estocadas do seu pincel. Jackson Pollock atirava, indisciplinadamente, tinta para telas espalhadas no chão tornando-as obras primas. O atelier do inglês Francis Bacon era uma notória e indisciplinada pocilga. Traduzindo: a disciplina é boa mas é para as actividades racionais. Por exemplo, Immanuel Kant era metódico, regrado e bom filósofo. Não consta que fosse bom de bola...
Dito isto, informo que é com grande escândalo que vi Liedson ser castigado por usar calças de fato de treino. É que a história é sempre a mesma: enquanto os parolos cá do sítio elogiam a veia disciplinadora de Paulo Bento, eu limito-me a constatar que o meu clube não vai ganhar nada enquanto não recuperar a picanha, a cuíca, os bacanais, o Ferrari e os quilos a mais do Rochemback. Já para não falar no épico "vai tomar no...". Bem, vocês sabem onde.
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